Raniel, ex-São Paulo e Santos, relembra abuso de álcool, drogas e drama pessoal

A tatuagem de uma data no seu rosto simboliza o dia em que deixou a bebida

O atacante lidou com a dependência química e ausência dos pais na infância

Raniel, do Vasco
Raniel, do Vasco

Rio de Janeiro, RJ, (12) – (AFI) – Raniel, atacante com passagens por São Paulo e Santos, se abriu sobre seus dramas pessoais nesta sexta-feira. O jogador, atualmente no Vasco, falou que teve de lidar, entre outras coisas, com a dependência química e ausência dos pais durante sua infância e adolescência. Ainda muito cedo, com a morte de seu pai, sua mãe o deu para a vizinha, que já tinha outros três filhos. Dione, como é chamada, passou a criá-lo “sem mesmo questionar”, como contou o atleta.

“Não gosto de julgar os pais que abandonam seus filhos, porque não sei o que se passava naquele momento. Eu sou pai também e, por mais que eu tente, nunca vou sentir a gravidade da situação como a minha mãe sentiu ao perder meu pai, o tamanho das dificuldades que ela enfrentava, as incertezas todas, pra ter chegado ao ponto de me abandonar”, relatou Raniel. Segundo o atacante, a casa de Dione não oferecia nenhum luxo e era difícil sustentar seus quatro filhos. Foi no futebol que Raniel, assim como muitos outros jovens, encontrou uma possibilidade de melhorar sua vida e ascender socialmente. “O pessoal do clube dizia que eu tinha talento. Só precisava manter a cabeça no lugar. Não consegui”, relatou em texto publicado no site The Players Tribune. Com 14 anos, Raniel cedeu ao mundo das drogas. De usuário, passou até a comercializar e traficar. No Santa Cruz, seu primeiro time como profissional, e já com 17 anos, foi pego no exame antidoping para cocaína.

O sentimento nesse momento foi de “medo, vergonha e desemprego.” “Eu estava com a minha avó quando a TV deu a notícia da minha suspensão. Ela ficou tão mal, tão arrasada. Achei que eu fosse perder ela também. Isso me machucou mais do que a própria punição. Ver ela ali chorando na frente da televisão acabou comigo. Eu me senti caindo de vez mais no abismo e que ele não tinha fundo, que eu desceria pra sempre até morrer. Mas o Santa Cruz estendeu a mão e me resgatou. O clube me manteve no elenco mesmo eu não podendo jogar”, contou Raniel.

BONS E MAUS MOMENTOS

No Cruzeiro, Raniel conta ter vivido uns dos melhores momentos e chegou a largar o álcool por um período. “Eles viam que eu estava querendo superar o meu passado e me ajudaram ao máximo.” Mas na sequência, os pesadelos de sua vida voltaram a atormentá-lo. Após deixar Belo Horizonte, em direção ao futebol paulista, Raniel teve de lidar com duas hospitalizações: sua e de seu filho, que quase o fizeram se afundar de vez nas drogas. Em 2020, Felipe, de apenas nove meses, teve de ser internado, por conta de uma parada cardíaca. Revezando na UTI com a sua esposa, o atacante se utilizou da bebida para tentar esquecer os problemas da vida. “Bebia, bebia, bebia até cair e bebia mais um pouco deitado. Só parava depois de desmaiar. Eu queria me destruir. Eu via que a qualquer momento algo grave ia acontecer comigo. E eu desejava que acontecesse, porque aquele abismo em que eu caí depois do antidoping no Santa Cruz ficou rasinho perto desse.”

Com seu filho recuperado e sem sequelas, uma trombose quase fez com que o jogador perdesse sua carreira e corresse risco de vida. “Uma provável complicação da covid”, como relatou Raniel, fez com que ele tivesse de ser operado às pressas. Nessa hora, ele confessa que chegou até a questionar Deus. “Fizeram a cirurgia. Me recuperei e tentei voltar a treinar, mas não dava. A trombose tinha criado uma fibrose enorme na minha perna, encurtado um tendão, e eu mal conseguia colocar o calcanhar no chão. Sem poder fazer o que eu amo, que é jogar bola, e bebendo cada vez mais, eu percebi que podia perder não só a minha carreira, mas também meus filhos e a minha família.”

VIRADA

Raniel conta que foi nesse momento que decidiu nunca mais se entregar à bebida, e carregar essa marca consigo. A tatuagem, estampada em seu rosto (07-12-20) simboliza a data em que ele deixou de beber, a maior de suas conquistas, dentro e fora do esporte. Contratado no início do ano pelo Vasco, o jogador ganhou uma nova oportunidade de fazer o que ama, após passar por todas as dificuldades em 2020 e 2021, e tem o objetivo de trazer o clube de volta à Série A. Contratado principalmente por conta do técnico Zé Ricardo, Raniel está pronto para demonstrar o que dele se espera. “Estou pronto para viver o melhor ano da minha vida. Mas, não importa o que aconteça nem quantos gols eu marque na temporada, eu finalmente me sinto em paz. Você não precisa sentir pena de mim. Apenas me conhecer. Eu sou Raniel, camisa 9 do Vasco, tenho 25 anos, três filhos e uma esposa incrível. E desde 07-12-20, não boto uma gota de álcool na minha boca.”

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