ESPECIAL SELEÇÃO: Filosofia de Tite se desgasta e time feminino cai no gosto popular

Ano foi de obrança para os homens, apesar do título da Copa América, enquanto mulheres ganharam atenção mesmo sem erguer taças

Ano foi de obrança para os homens, apesar do título da Copa América, enquanto mulheres ganharam atenção mesmo sem erguer taças

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Campinas, SP, 31 (AFI) – Tite chegou ao comando da seleção praticamente como unanimidade, cercado por certa mística e credenciado pelo grande trabalho feito no Corinthians. Desde o fim da Copa da Rússia, em 2018, no entanto, o professor começou a ser questionado com mais frequência, situação que se intensificou na atual temporada, mesmo com a conquista da Copa América.

Diante deste contexto, parte da torcida deu uma chance ao time feminino, muito disso por causa da luta por visibilidade iniciada pelas próprias jogadoras, e encontrou a conexão que há tempos não sentia nessa conturbada relação com o time nacional. É claro que o apelo comercial da seleção masculina ainda é muito grande, mas o ano de 2019 mostrou que há um claro desânimo, e impaciência, dos torcedores quando o assunto é Tite e sua disfuncional equipe canarinho.

O ano da seleção brasileira de homens começou de maneira bastante frustrante, com empate por 1 a 1 diante do Panamá, no Estádio do Dragão, em março. Três dias depois, a redenção veio com uma vitória por 3 a 1 sobre a República Tcheca. Em nova data FIFA, no mês de julho, muito se questionou a qualidade dos adversários escolhidos. Apesar disso, os triunfos por 2 a 0 sobre Qatar e por 7 a 0 em cima de Honduras serviram para levantar alguns pontos positivos e elevar a autoestima dos jogadores antes da Copa América.

Pia Sundhage é esperança na seleção feminina, enquanto Tite já não é mais unanimidade no time masculino. (Foto: Lucas Figueiredo / CBF)

Pia Sundhage é esperança na seleção feminina, enquanto Tite já não é mais unanimidade no time masculino. (Foto: Lucas Figueiredo / CBF)

SEM NEYMAR, COM CEBOLINHA
Na disputa do torneio continental, tudo correu bem, apesar de alguns momentos de sofrimento, como a vitória nos pênaltis após empate sem gols nas quartas de final, contra o Paraguai. Para alegria dos brasileiros, teve vitória por 2 a 0 sobre a Argentina, nas semis, antes da grande decisão contra o Peru, vencida por 3 a 1 pelo Brasil.

Tudo isso foi vivido sem a presença de Neymar, a grande estrela da seleção. Ele se lesionou ainda durante a vitória sobre o Catar e não se recuperou a tempo de disputar a Copa América. O rendimento do time sem o craque foi visto, por muitos analistas, como um sinal de que existe vida na seleção sem a presença de Neymar, que na época vivia o peso de uma acusação de estupro, entre outras polêmicas.

A ausência do jogador do PSG, aliás, foi importante para destacar outros talentos convocados por Tite para a disputa da competição. O fator mais animador de toda a participação do Brasil foi o desempenho de Everton Cebolinha, do Grêmio. O atacante não sentiu o peso da amarelinha e foi o grande destaque, tanto que foi eleito o Homem do Jogo na final contra o Peru, partida em que foi o autor do primeiro gol.

Everton Cebolinha roubou a cena na Copa América. (Foto: Lucas Figueiredo / CBF)

Everton Cebolinha roubou a cena na Copa América. (Foto: Lucas Figueiredo / CBF)

JEJUM, DESGASTE E COBRANÇA
O título foi incontestável e por muitos dias se falou, na imprensa esportiva, sobre toda a questão envolvendo Neymar. Será que a seleção precisava dele mesmo? O certo é que depois da Copa América, já com o craque de volta, a vida da seleção brasileira se complicou muito, com atuações ruins, convocações contestadas e um incômodo jejum de vitórias.

O Brasil ficou cinco jogos sem vencer, derrotado por Argentina e Peru em meio a empates com Colômbia, Senegal e Nigéria. Na despedida da temporada, conseguiu bater a Coreia do Sul por 3 a 0, em jogo disputado no dia 19 de novembro, mas isso não impediu que Tite terminasse o ano sob desconfiança.

INÍCIO RUIM DAS MENINAS
Ao contrário do time masculino, a seleção feminina do Brasil não levantou nenhuma taça na temporada 2019 – a última conquista foi a Copa América de 2018. Também na contramão dos homens, no entanto, as brasileiras viram o interesse pelo esporte que praticam crescer consideravelmente e viveu um ano que pode ter sido um divisor de águas para o futebol feminino. De qualquer maneira, é preciso conter a ansiedade e esperar pelos próximos episódios para ter certeza de que a valorização irá continuar.

O início da temporada foi de muita frustração e de número bastante ruins. As atividades oficiais começaram no final de fevereiro, com a disputa do torneio amistoso She Believes, disputado nos Estados Unidos, e as meninas voltaram de lá com três derrotas na bagagem. As adversárias foram Japão, Estados Unidos e Inglaterra, três grandes forças da categoria.

Depois disso, a seleção disputou mais dois amistosos, os últimos antes da Copa do Mundo, e perdeu os dois, para Espanha e Escócia. Ou seja, o time chegou ao Mundial da França sem ter vencido uma partida sequer durante o período de preparação.

Marta marcou gol histórico contra a Itália. (Foto: Assessoria / CBF)

Marta marcou gol histórico contra a Itália. (Foto: Assessoria / CBF)

SUPERAÇÃO E VISIBILIDADE
As esperanças foram renovadas assim que a Copa começou. Logo na estreia, no dia 9 de junho, o Brasil fez 3 a 0 na Jamaica, quebrou o jejum e recuperou a confiança. Na sequência, perdeu por 3 a 2 para a Austrália, mas conseguiu a classificação em uma emocionante vitória por 1 a 0 sobre a tradicional Itália. Autora do gol da vitória, Marta entrou para a história dos Mundiais e se tornou a maior goleadora entre homens e mulheres. Com 17 bolas na redes, a rainha deixou o alemão Klose para trás e lidera as estatísticas de forma isolada.

A repercussão do Mundial já vinha sendo grande no Brasil, até pela atenção inédita dada pela mídia ao torneio, mas aumentou de vez depois da vitória sobre as italianos e criou grande expectativa para o duelo contra a anfitriã França, nas oitavas de final. Em uma atuação de superação, as brasileiras conseguiram empatar por 1 a 1 no tempo normal, com gol de Thaísa, mas as francesas marcaram na prorrogação e venceram por 2 a 1.

Público tem dado mais atenção ao futebol feminino. (Foto: Mauro Horita / CBF)

Público tem dado mais atenção ao futebol feminino. (Foto: Mauro Horita / CBF)

REFORMULAÇÃO
A eliminação doeu bastante, mas foi importante para diagnosticar que a seleção precisava de mudanças. Isso ficou bastante evidente diante das exibições das outras seleções durante o Mundial, como a própria França de Corinne Diacre, a Inglaterra de Garry Neville, a Holanda de Sarina Wiegman, a Suécia de Peter Gehardsson e as campeãs dos Estados Unidos de Jill Elis.

Inspirada no campeão, a CBF decidiu demitir Vadão e colocar uma mulher no comando. A escolhida foi a sueca Pia Sundhage, que tem no currículo dois ouros olímpicos (2008 e 2012) e um vice do Mundial (2011), todos com a seleção americana.

ESPERANÇA
A trajetória de Sundhange foi iniciada da melhor maneira possível, com uma goleada por 5 a 0 sobre a Argentina, em torneio amistoso disputado em São Paulo. Depois, foi vice ao perder nos pênaltis após empate sem gols no tempo normal.

As meninas do Brasil também foram vice em torneio amistoso disputado na China, mais uma vez perdendo nos pênaltis, justamente para as chinesas. Antes disso, entretanto, mostrou que tem muito potencial ao vencer a Inglaterra por 2 a 1, em amistoso na Terra da Rainha, e também goleando o Canadá por 4 a 0, na China.