Especial FI! São Caetano não venceu a Libertadores, mas conquistou a América

Apesar da derrota, o Azulão escreveu uma das mais bonitas histórias do futebol brasileiro no século

São Caetano foi vice-campeão da Libertadores de 2002 para o Olímpia do Paraguai

São Caetano
Azulão foi vice da Libertadores de 2002. (Foto: Reprodução)

Por Filipe Saochuk

São Caetano, SP, 31 (AFI) – Quando se fala sobre o São Caetano em 2024 e a triste situação que o clube vive, não se imagina que há pouco mais de 20 anos, o Azulão chegou a ser uma das melhores equipes não apenas do Brasil, mas do continente. Em 31 de julho de 2002, o clube do ABC chegou a uma inédita decisão de Copa Libertadores da América contra o Olímpia, do Paraguai, mas acabou derrotado. Porém, muitas vezes no futebol, a história mais marcante nem sempre é sobre aquele que levantou a taça.

Neste Especial FI, relembre o São Caetano que ficou conhecido como o Esquadrão Imortal, a trajetória naquela fatídica Libertadores de 2002 e saiba mais sobre o personagens de uma das histórias mais impressionantes e memoráveis do futebol brasileiro. O título não veio, mas o Azulão definitivamente, conquistou a América.

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UM JOVEM CLUBE ENCANTAVA O BRASIL

A campanha do clube na ‘Liberta’ de 2002 foi o ápice daquela geração do São Caetano, mas o sucesso começou a ser construído alguns anos antes. Comandado pelo técnico Jair Picerni, o Azulão foi campeão da Série A2 do Paulistão em 2000, e no mesmo ano, foi vice-campeão do Brasileirão (chamada de Copa João Havelange naquela confusa edição), perdendo a decisão para o Vasco por 4 a 2 no agregado.

O vice no campeonato nacional rendeu a primeira classificação do time do ABC para a Copa Libertadores. O clube caiu no Grupo 7, ao lado de Cruz Azul-MEX, Defensor-URU e Olmedo-EQU, e na primeira fase, o Azulão fez bonito. A classificação para o mata-mata veio com a segunda posição e oito pontos conquistados.

Porém, a campanha do São Caetano não foi muito mais longe do que isso. Nas oitavas de final, o Azulão tinha pela frente o Palmeiras. O clube do ABC venceu a ida no Anacleto Campanella por 1 a 0, mas na volta o Verdão triunfou pelo mesmo placar e conquistou a classificação nos pênaltis.

Voltando ao cenário nacional, o Azulão ficou no quase mais uma vez. Novamente chegando à final do Brasileirão, o título de 2001 ficou com o Athletico-PR, pelo placar agregado de 5 a 2. A taça não veio, mas aos poucos, o até então pequeno clube da Grande São Paulo começava a buscar o seu espaço no futebol brasileiro.

Mas foi no ano seguinte, novamente classificado para a Libertadores, que o São Caetano escreveu uma das mais bonitas histórias do esporte no século, mesmo que o final dela não tenha sido de “conto de fadas”.

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Adãozinho e Kléberson na final do Brasileirão de 2001. (Foto: Reprodução)

A ZEBRA VIROU POTÊNCIA

Visto como uma zebra em 2000, o Azulão do ABC ganhou o devido respeito após quase três anos se estabelecendo como uma das equipes mais fortes e temidas do país. Com todo o carisma de ser um clube que “surgiu do nada”, de fora da capital, logo se tornou um queridinho dos torcedores de outros clubes do Brasil. No fundo, todos queriam ver aquele time ter o sucesso que merecia.

Naquelas campanhas de Brasileirão, o São Caetano deixou para trás clubes do calibre de Bahia, Palmeiras, Grêmio e Atlético-MG. O “patinho feio” entre tantos gigantes, fundado apenas em 1989, sonhava. E na Libertadores de 2002, entraria para fazer história.

COMEÇA A LIBERTADORES DE 2002

O goleiro Sílvio Luiz, o meia Marcos Senna, os atacantes Aílton, Brandão e Anaílson, e claro, o técnico Jair Picerni. A base do São Caetano que encantava o Brasil foi mantida para aquele ano, temporada que o clube disputaria a segunda Libertadores de sua história, e infelizmente, a última.

No Grupo 1, o Azulão brigaria pela vaga com clubes tradicionais da América do Sul. Cerro Porteño, do Paraguai, Allianza Lima, do Peru, além do Cobreloa, do Chile. Com status de ser um dos favoritos a se classificar, garantiu a vaga em primeiro com 12 pontos, juntamente com o Cobreloa, que fez os mesmos 12 pontos.

Mostrando a sua força, a classificação na Fase de Grupos veio com resultados expressivos, como um 3 a 0 sobre o Allianza fora de casa, e um 3 a 1 contra o Cerro também longe de seus domínios.

Novamente nas oitavas de final, o adversário desta vez seria a Universidad Católica, do Chile. E contra os chilenos, a campanha do Azulão poderia ter acabado precocemente mais uma vez.

Em Santiago, empate por 1 a 1, com o gol do time paulista sendo anotado por Anaílson, logo aos nove minutos. Na volta, outro 1 a 1 no Anacleto, com o tento azulino sendo marcado pelo jovem Brandão, de 22 anos.

Nos pênaltis, sob muita pressão, os donos da casa conseguiram se sobressair, vencendo por 4 a 2 e carimbando a primeira participação do São Caetano nas quartas de final da principal competição do continente.

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Foto: Reprodução

UM GIGANTE URUGUAIO ESTAVA NO CAMINHO

Na fase seguinte, uma das mais tradicionais equipes do futebol sul-americano estava pelo caminho azulino: o pentacampeão da Libertadores, Peñarol do Uruguai. No duelo de ida no Centenário de Montevidéu, os donos da casa levaram a melhor. Por 1 a 0, o clube aurinegro venceu a primeira partida das quartas.

Porém, no Anacleto Campanella, o São caetano mostrou a sua força mais uma vez. O time uruguaio abriu o placar com apenas um minuto de jogo, mas com gols de Jean Carlos e Somália, a virada veio, levando a decisão mais uma vez para os pênaltis. Com a ajuda do goleiro Sílvio Luiz, o Azulão venceu por 3 a 1 e deixou um gigante para trás.

Na já histórica campanha, o clube paulista teria o América do México pelo caminho, dono da melhor campanha da primeira fase. Desta vez a partida inaugural do confronto foi na casa do Azulão, e o resultado, excelente. Com um sólido 2 a 0 construído com tentos de Adãozinho e Somália, o São Caetano tinha ótima vantagem para a volta na Cidade do México.

E no colossal estádio Azteca, o Azulão não se intimidou. Logo aos oito minutos, Aílton abriu o placar, deixando a vantagem ainda mais confortável. Os mexicanos até buscaram o empate, mas com o 3 a 1 no agregado para os brasileiros, não restava mais dúvidas.

Com apenas 13 anos de vida, o pequeno gigante do ABC estava em um lugar que muitos grandes clubes do Brasil ainda não haviam chegado. O São Caetano era finalista da Copa Libertadores da América.

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Foto: AFP

A TRISTEZA DA DERROTA NÃO APAGA A INESQUECÍVEL HISTÓRIA

Na finalíssima de 2002 da principal competição do continente, uma surpresa e um bicampeão da Libertadores: São Caetano e Olímpia do Paraguai.

No duelo de ida no lendário estádio Defensores del Chaco, em Assunção, a história do Azulão na decisão começou da melhor forma possível, que talvez nem o mais otimista torcedor caetanista poderia sonhar.

Para mais de 40 mil pessoas, no dia 24 de julho, o Gigante do ABC venceu a primeira partida da final. Aos 15 minutos do segundo tempo Russo arrancou pela direita e cruzou na cabeça de Aílton, que acertou o único espaço entre a trave e o goleiro para calar o maior estádio do Paraguai. Com o 1 a 0, o Azulão traria para o Brasil uma ótima vantagem.

A volta estava definida para o fatídico dia de 31 de julho. Em um Pacaembu lotado, o técnico Jair Picerni mandou o Azulão à campo com: Silvio Luiz; Russo, Daniel Dininho, Rubens, Cardoso; Marcos Senna, Aílton, Anaílson, Adãozinho; Robert e Somália.

Aos 31 minutos, um personagem conhecido aparecia novamente. O camisa 8 Aílton, entrou pelo meio da área e tirou do goleiro Tavarelli para incendiar o estádio. 1 a 0 na volta, 2 a 0 no agregado, e um título que parecia questão de tempo. Mas infelizmente, no futebol o conceito de “justiça” muita vezes não existe.

Na segunda etapa, Gastón Córdoba empatou logo aos 4 minutos, e aos 14, Richard Báez virou. A definição do campeão da Libertadores ficava para as penalidades.

Para o Azulão, Marcos Senna e Adãozinho fizeram, mas Marlon e Serginho perderam. Pelo Olímpia, todos converteram. Depois de uma das mais memoráveis campanhas da história da Libertadores, o troféu não ficava no ABC Paulista. Pela terceira vez, o Alvinegro Paraguaio ficava com o título. Pela terceira vez em três anos, o Azulão era vice.

Porém, quem realmente conquistou a América, foi a Associação Desportiva São Caetano.

Afinal, no futebol, muitas vezes não é preciso levantar uma taça para ficar na memória daqueles que o amam. Naquele ano, todos os torcedores do país eram ao menos um pouquinho caetanistas, e todos ao menos um pouquinho, sofreram com a derrota. Não à toa, aquele time ficou eternizado como o Esquadrão Imortal.

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Foto: Reprodução

UM CLUBE MACHUCADO PELO TEMPO

Em 2004, comandado por Muricy Ramalho, o merecido título do clube finalmente aconteceu, com a conquista do Paulistão sobre outro clube do estado que começava a se destacar, o Paulista de Jundiaí.

Naquele mesmo ano, ocorreu a trágica morte de Serginho no gramado do estádio do Morumbi, e partir dali, o São Caetano não foi mais o mesmo. Sofrendo com gestões temerárias, aos poucos o clube foi perdendo a força e a capacidade de ser protagonista no futebol estadual e nacional.

Pouco mais de 20 anos depois de chegar tão perto de conquistar a Libertadores e disputar um Mundial, o Azulão se encontra nas ruínas deste passado encantador. Lutando diariamente para seguir existindo e se reerguer, o clube atualmente disputa a Série A4 do Campeonato Paulista, ainda sem grandes perspectivas de melhora.

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Estádio Anacleto Campanella. (Foto: Rodrigo Corsi/Paulistão)

HERÓIS DA CAMPANHA

SÍLVIO LUIZ

O goleiro se tornou um ídolo do clube, completando mais de dez anos no São caetano. Pilar daqueles times do começo do milênio, foi um dos melhores do país no período e chegou até mesmo a ser convocado para a Seleção Brasileira. Sílvio deixou o Azulão em 2006, mas nunca mais repetiu o mesmo sucesso.

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Foto: AFP

SERGINHO

Um dos pontos de equilíbrio da equipe, o zagueiro e volante também protagonizou um dos momentos mais tristes do futebol brasileiro. Em 2004, sofreu uma parada cardíaca contra o São Paulo no Morumbi, e acabou falecendo. Serginho será eternamente lembrado.

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Foto: Reprodução

MARCOS SENNA

O atleta de maior sucesso na carreira daquele São Caetano. Volante de extremo talento, se transferiu para o Villarreal da Espanha, fez carreira no clube e inclusive se naturalizou espanhol, sendo campeão da Eurocopa de 2008 com La Roja.

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Foto: Reprodução

AÍLTON

Já veterano, o meia foi um dos craques do Azulão por anos. Autor de gols nos dois jogos da final, poderia ter sido eternizado como o grande herói da conquista. No ano seguinte, se aposentou do futebol.

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Foto: Reprodução

ADHEMAR

Apesar de não ter disputado a Libertadores de 2002, Adhemar é talvez o maior ídolo da história do São Caetano. O atacante fez muitos gols entre 2000 e 2001, o que rendeu a sua transferência para o Stuttgart da Alemanha. O jogador ainda teve outras passagens pelo clube até se aposentar.

“Triste ver a situação de um time que figurou entre as melhores do futebol brasileiro, brigando por grandes campeonatos. Eu fico muito chateado, mas o Azulão é forte e vai renascer das cinzas”, declarou Adhemar ao Portal FI sobre o momento do São Caetano.

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Foto: Reprodução

BRANDÃO

Ainda um jovem atleta em 2002, Brandão foi o artilheiro do São Caetano na Libertadores de 2002 com seis gols. Após o sucesso no ABC, fez carreira na Europa, com várias temporadas em clubes como Shakhtar Donetsk e Olympique de Marselha, além de passar por Grêmio e Cruzeiro.

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Foto: Arquivo/Reprodução

JAIR PICERNI

O treinador foi o responsável por fazer aquele time funcionar e encantar o Brasil por quase três temporadas. Alvo de críticas por “ficar sempre no quase”, foi para o Palmeiras em 2003 e conquistou o título da Série B com o Verdão. Treinando outros times importantes do país e do estado, Picerni se aposentou em 2012.

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Foto: Reprodução/Getty