Brasileiro que fez 'gol Puskás' resgata amputados em depressão usando o futebol
Na manhã do último domingo, foi dada a abertura ao Campeonato Paulista de Futebol de Amputados
Willian Farias ganhou os holofotes por repetir o gol que deu ao polonês Marcin Olesky o título do Prêmio Puskás,
Campinas, SP, 20 – Na manhã do último domingo, foi dada a abertura do Campeonato Paulista de Futebol de Amputados. Um clima festivo dá o tom do ambiente onde atletas dos oito times participantes se confraternizam em um espaço que separa o campo dos vestiários. Em meio a sorrisos, abraços e brincadeiras, alguns dos boleiros que agora vivem essa sensação de inclusão social tiveram suas trajetórias modificadas pelas mãos de William Farias. Quando não está trabalhando como funcionário de TI, o meia-atacante usa o seu olho clínico para apresentar o esporte adaptado a deficientes que, muitas vezes, se encontram no fundo do poço por causa da transformação provocada pela amputação.
FALA, WILLIAN
“Conseguir apresentar o esporte a pessoas que não tinham perspectivas, e perceber a realização delas jogando futebol de amputados é maravilhoso. Quando você resgata uma vida, muda toda uma família. A pessoa começa a se integrar de uma maneira diferente e isso reflete nos filhos, na mulher, nos irmãos, nos pais. Ele deixa de ser um coitado e passa a se tornar um cidadão”, afirmou.
REFERÊNCIA
Com um currículo recheado de conquistas e convocações frequentes para a seleção brasileira de amputados, William, de 38 anos, é uma referência na modalidade. Pelo Corinthians, foram sete títulos Brasileiros, sete Paulistas e ainda seis troféus da Copa do Brasil. Tamanha categoria rendeu até um apelido. Se no futebol profissional, o Brasil transformou Ronaldinho Gaúcho em R10, na categoria amputados, William Farias teve acrescentado à letra inicial de seu nome (W) o número imortalizado por Pelé.
“Sou mais um garçom, um articulador, do que um artilheiro nato”, disse em tom humilde. O meia comentou ainda sua inspiração no futebol em Ronaldo Fenômeno. “Esse cara sofreu muitas contusões e conseguiu superar tudo. Para mim, é um verdadeiro exemplo de perseverança”, afirmou o jogador que este ano vai defender o São Bento de Sorocaba.
PRÊMIO PUSKAS
Recentemente, W10 ganhou os holofotes por repetir o gol que deu ao polonês Marcin Olesky o título do Prêmio Puskás, deixando Richarlison em segundo plano. Apesar da fama e da visibilidade que o seu “feito” ganhou com a viralização do vídeo na internet, o habilidoso meia tratou o assunto com banalidade. A realização vem mesmo de poder estender a mão para anônimos que não superaram a perda de um membro e precisam de ajuda.
“É o que dá sentido à nossa existência. Se eu faço isso hoje, é porque alguém me ajudou quando eu mais precisei”, disse William Farias à reportagem do Estadão pouco antes da solenidade de abertura do Campeonato Paulista de Futebol de Amputados.
SUPERAÇÃO
Em janeiro de 2011, um acidente de moto virou a sua vida de cabeça para baixo. Com a colisão veio a perda parcial da perna direita. Após meses de forte depressão, um amigo o levou ao futebol de amputados. Além da mudança psicológica, essa nova fase provocou também uma nova visão de mundo.
“Na modalidade eu descobri muitas pessoas que tinham o mesmo problema que eu e eram muito felizes. Aqui temos verdadeiras lições de vida. Se você não tem um trauma, uma amputação, muitas pessoas nessas condições vão passar ao seu lado e você não vai perceber. Então, comecei a reparar mais nessas situações. Assim comecei a resgatar algumas vidas”, comentou W10.
E no papel de “olheiro”, sua busca rendeu frutos tanto na questão de inclusão, como também no que diz respeito a rendimento. Felipe, Carlos e Allan Mosquito conheceram o futebol de muletas após a abordagem de William. Hoje, o trio integra a seleção brasileira de amputados.
EVENTO MOVIMENTA ESPAÇO E ATRAI CRIANÇAS
Cercada de protocolos, com direito a times perfilados e também execução do hino nacional, a rodada de abertura do Campeonato Paulista de futebol de amputados contou até com uma transmissão improvisada de uma web rádio direto da arquibancada que chegou a ter um público de cerca de 200 pessoas.
No campo, crianças dividiram o espaço com os atletas antes de os jogos terem início. Convidado especialmente por um dos organizadores, Gustavo Paulon Lopes, de sete anos, aluno da escola Pé no Chão Cirandarte, acabou vivendo um momento especial. O menino, que nasceu com uma má formação congênita, e usa uma prótese na perna direita, interagiu com colegas de seu colégio que também estiveram no evento. Entusiasmado, arriscou até alguns chutes no gol.
“Essa experiência dele aqui está sendo ótima. O Gustavo não está se sentindo diferente, está brincando muito com os amigos da escola e tudo parece uma festa. Ele se impressionou com o tamanho do campo e achou tudo muito bonito”, afirmou a mãe Bruna Paulon Lopes.